domingo, 11 de maio de 2008

Heroina



Vanda Maria Amorim

Hoje, quando vemos uma família com quatro filhos, a maioria de nós se espanta e acha loucura. Aliás, muitos casais acham loucura ter mais que um filho. "Não dá, a vida tá muito difícil e quero dar o melhor para meu filho": esse é o argumento geral que ouço.~Tenho aprendido que não temos que nos preocupar em dar o melhor para os nossos filhos; temos que dar o melhor de nós, e aí não entra dinheiro; entra atenção, carinho, dedicação.

Mais que nunca considero minha mãe - Cleonice, Nicinha, dona Cleo - uma heroína, uma guerreira vitoriosa. Teve 12 gestações, vingando 11. Todos nascidos de parto normal em Paulo Afonso. Aos 17 anos casou. Aos 19 pariu a primeira, Tata. Aos 36, a caçula, Lu. Aos 40 "perdeu" o marido para uma garota de 17, que engravidara. Desesperou-se, zangou-se, desatinou e quase enlouquece. O ódio e o rancor quase a destrói.

Sertaneja dura na queda, aprendeu que precisamos ter sabedoria para aceitar as coisas que não podemos modificar e coragem para modificar as que podemos. A coragem ela não teve. Mas aceitou que não tinha como modificar o que a vida lhe trouxe. Mas o aprendizado foi a duras penas. Diabetes e hipertensão foram consequências dos picos emocionais. Depressão quase a afunda sem volta.

A maturidade trouxe o perdão. O amor venceu, como tem que ser. Conseguiu entender que determinadas derrotas da vida se traduzem, mais à frente, em vitórias. Entre elas, o da liberdade.

Aos 72 anos, Nicinha ainda tem alguns lampejos de tristeza. Está aprendendo também que pode mandar essa sombra embora e que é abençoada. Enquanto mães, aos milhões, sofrem a perda de um filho, está com os 11 vivos. Uns melhores que outros materialmente. Mas todos vivos, mesmo que espalhados por cinco cidades no Brasil: três em Paulo Afonso (BA), três em Salvador (BA), duas em São Paulo (SP), dois no Recife (PE) e uma em Xingó (AL). Todos com grande amor e gratidão por essa mulher que traduzia amor, em nossa infância, com o zelo e o rigor, e que aprendeu a receber e dar carinho, derretendo-se a um abraço, um cafuné e uns beijinhos nos olhos. Aprendeu a dar e a receber colo. Por isso parece, hoje, mais jovem que era a 30 anos atrás.

Esta é minha mãe. Em seu nome desejo paz de espírito para todas as mães: biológicas, emprestadas ou de coração. Que todas vivam e deixem viver.

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